Review | Ventos de Agosto (2014), de Gabriel Mascaro

Ventos de Agosto

Gabriel Mascaro, nome representativo do cinema pernambucano, competiu no Festival de Brasília com “Ventos de Agosto”, exibido recentemente no Festival de Locarno. Enquanto Marcelo Pedroso, que participou com “Brasil S/A”, se utilizou de alegorias demais para refletir sobre o Brasil, Mascaro elabora um filme mais específico em sua proposta de pensar a morte. Em termos narrativos, era o que eu particularmente estava esperando na programação do evento, principalmente vindo de uma produção de Pernambuco. Experimentar novas sensações é bastante importante para manter a produção do estado ativa e em constante renovação. Falar o mais do mesmo não é mais adequado.

A trama acompanha dois jovens que vivem em uma pacata ilha de pescadores. A rotina é alterada quando um pesquisador de ventos aparece no local para registrar os sons dos alísios na zona de convergência intertropical. A leveza da trama pode até esconder sua profundidade, principalmente por se aproveitar de gêneros como a comédia e um leve terror, mas as intenções de Mascaro estão claras. Além de falar sobre o corpo humano com uma precisão valiosa, ele reflete sobre esses mesmos corpos que estão destinados a serem engolidos pelo mar e lembra que lidar com a morte ainda é um dos principais desafios de quem vive.

Abraçando o caráter antropológico, o diretor mostra costumes e crenças, e estabelece bem a relação entre os moradores da ilha, principalmente após a aparição do pesquisador de ventos, interpretado pelo próprio Mascaro, que guia o público por espaços a serem explorados na região. A atuação de Dandara de Morais é magnética, principalmente quando está sozinha em cena. Ao lado de Geová Manoel dos Santos, que interpreta o personagem Jeison, os dois estabelecem uma química sedutora meio aos conflitos do vilarejo.

As pontas soltas foram propositais, segundo o diretor. Existem vários filmes dentro deste, o que nem sempre é adequado mesmo no cinema independente. É preciso ter pleno controle da história que precisa ser contada e sobre como as lacunas podem ser preenchidas, no caso de serem abertas. Mas no caso de “Ventos de Agosto”, a comunicação criada com o público não entra em conflito e é possível se relacionar e criar em cima da obra do autor. O longa também é belamente filmado, ainda que peque ao disfarçar pouco a dublagem de alguns personagens, fazendo com que isso tire a imersão em determinadas sequências.

A fotografia de Mascaro é o destaque, seja registrando os corpos entre os dois personagens após o sexo em um caminhão de cocos ou tornando o vento imagético. Como o próprio vento leva, a vida também passa em um piscar de olhos. Quando menos esperamos, passamos da validade e o que importa, no fim da vida, é o que cada um deixou de importante para quem ama.

O filme fez parte da programação do 47º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em setembro de 2014. Crítica adaptada a partir de texto publicado pelo autor no Jornal Diário do Nordeste.

Avaliação: 8/10

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