Crítica | Lion: Uma Jornada para Casa (2016), de Garth Davis

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Avaliação: 3/5

Os temas familiares nunca estiveram tão em alta nessa temporada de premiações pré-Oscar. Em “Lion: Uma Jornada para Casa”, o diretor australiano Garth Davis se inspira em uma história real para mostrar a jornada de um indiano que foi separado da família ainda criança.

A história mergulha no sentimentalismo e, claro, na romantização do que aconteceu com o garotinho Saroo. Na primeira hora de projeção, o indiano é interpretado pelo ótimo Sunny Pawar, cuja inexperiência em cinema contribui para a naturalidade das sequências. Pawar consegue transmitir na profundeza do olhar o sentido de perda e culpa, gerados pela separação irreversível que acontece.

O roteiro chega a sugerir que a história de Saroo poderia ganhar novas camadas, como a politização da perda e do abandono de crianças na Índia, desprezadas pelas autoridades que percebem nelas um comércio lucrativo. Infelizmente, não é o que acontece e os realizadores deixam bem claro que o interesse está na história do personagem, sem expandi-la para outros lados.

Embalado por uma trilha sonora que nunca abandona os dedilhados de piano e a dose extra de açúcar, “Lion: Uma Jornada para Casa” conta mais uma história de superação: o jovem indiano adotado por uma família australiana que o ama e que parte em busca de suas origens.

Quando Pawar cumpre o seu papel na primeira fase da trama, Dev Patel assume o restante do filme de forma distinta, com um tom mais novelesco que a história se torna. Patel é um ator competente e segura bem os conflitos de um jovem que decide buscar sua família de sangue, mas a figura do herói destoa do naturalismo anteriormente alcançado por Pawar, trazendo um tom mais enlatado dos dramalhões americanos que surgem de tempos em tempos na indústria.

O roteiro assinado por Luke Davies, a partir do livro escrito pelo próprio Saroo Brierley, segue pelo caminho mais fácil. A forma como Saroo descobre tudo sobre o seu passado, um insight rápido e indolor, aniquila a trajetória do personagem vista até então, fazendo com que o terceiro ato seja oferecido goela abaixo para o público.

O reencontro com a família de sangue é um momento bonito, principalmente por trazer uma questão inesperada em relação ao irmão de Saroo, por quem ele nutria admiração, mas desliza ao criar um impacto emocional menos palpável devido ao complexo de infalibilidade do protagonista.

Mesmo que a fragilidade do roteiro vá surgindo junto com os clichês dos dramalhões típicos de Hollywood, “Lion: Uma Jornada para Casa” se revela tecnicamente bem realizado, com destaque para a montagem de Alexandre de Franceschi e a direção de fotografia de Greig Fraser, indicado ao Oscar pelo desempenho no longa-metragem.

A oscarizada Nicole Kidman interpreta a mãe adotiva que salva o pequeno Saroo de um destino pior. A atriz mostra que está em ótima forma para atuar em dramas mais densos, com uma performance à altura de “As Horas” (2002), pelo qual levou sua única estatueta dourada até agora.

Kidman interpreta uma mãe compreensiva, mas cuja visão de mundo é potente. Além de Saroo, ela também adotou outro garoto indiano, com personalidades bem diferentes. Perceber como os dois filhos divergem na relação com a família adotiva é um ponto forte do filme, só possível pela harmonia do elenco em cena.

A atriz Rooney Mara aparece bem à vontade como o interesse romântico da segunda fase do protagonista e estrela a cena mais acertada da obra: um jantar em que ela tenta servir de elo entre Saroo e seus pais adotivos; o ponto alto da trama.

Entre altos e baixos, “Lion: Uma Jornada para Casa” é uma obra que “tem a cara do Oscar”, por suas alternativas nada arriscadas de reconhecer heróis da vida real. Como obra, fica bem atrás dos demais concorrentes dessa temporada de ouro.

Publicado originalmente pelo autor no Jornal Diário do Nordeste.

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